Com a aprovação da reforma da Previdência em primeiro turno na Câmara dos Deputados e a previsão de que o texto passe em segundo turno sem dificuldades, a percepção de risco do investidor internacional sobre o Brasil caiu para o menor patamar em quase cinco anos.
O Credit Default Swap (CDS) de cinco anos, espécie de termômetro do risco país, era negociado na sexta-feira, 19, em 128 pontos, patamar que não era registrado desde setembro de 2014 – quando o Brasil era classificado como grau de investimento pelas agências de rating.
Além do avanço na reforma previdenciária, contribuiu para a redução do risco país o cenário de um mercado internacional mais calmo, com a perspectiva de queda do juro nos Estados Unidos e na Europa. A avaliação do mercado é que o risco de uma crise fiscal diminuiu, ao mesmo tempo em que reduziu a chance de haver uma fuga de recursos para os EUA – o que seria provável caso o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) elevasse os juros, como considerava fazer no início do ano.
“O cenário para os emergentes é melhor agora. O dólar não vai se apreciar tanto, o que ajuda esses países. E, uma vez aprovada a reforma, abre um caminho para outras coisas (reformas) andarem. Podemos começar um círculo virtuoso”, disse o chefe de economia e estratégia do Bank of America Merrill Lynch no Brasil, David Beker.
Para o economista Leonardo Porto, do Citi, a aprovação da reforma da Previdência num momento de virada no ambiente externo pode colocar o Brasil numa posição privilegiada. Com a provável queda do juro americano, a liquidez mundial deve aumentar e os investidores terão de buscar alternativas. “Esse é o melhor dos mundos para os emergentes, especialmente para o Brasil”, diz Porto.
Ele destaca que a reforma é importante para ancorar as expectativas das contas públicas, uma condição necessária para o crescimento. “Mas não é uma panaceia”, destaca. Para convencer os investidores estrangeiros, o Brasil ainda precisa dar sinais de que outras agendas serão implementadas.
O economista-chefe do Goldman Sachs para a América Latina, Alberto Ramos, ressalta, porém, que a aprovação da reforma em primeiro turno, com um número maior de votos do que o previsto, não garante que outros textos passarão com facilidade. “Foi feito um trabalho (de articulação política) pela Previdência. A base para outras reformas não está tão clara”, diz.
Na lista de melhorias necessárias estão medidas para facilitar o ambiente de negócios, reduzir a burocracia e aumentar a produtividade. Tem ainda a reforma tributária, diz o economista-chefe do Itaú, Mario Mesquita. Na avaliação dele, se o País conseguir dar andamento a essas mudanças, terá vantagem em relação aos demais emergentes. “Além da agenda de reformas do Brasil ser bem vista pelos estrangeiros, os desafios dos outros emergentes são mais intensos. Portanto, o País pode ser beneficiado.”
A queda do CDS do Brasil tem sido uma das mais rápidas entre os emergentes. Em maio, o CDS brasileiro chegou a encostar em 200 pontos, em meio a ruídos entre o Planalto e o Congresso e ao estresse no mercado internacional com a tensão entre China e EUA. Há um ano, as taxas superaram 300 pontos.
Quando a Previdência começou a avançar no Congresso, em junho, as taxas passaram a cair rapidamente. O Brasil hoje tem CDS perto do México (115 pontos), país classificado como grau de investimento. Mas a taxa brasileira ainda está alta em relação a outras economias, como o Chile (36 pontos) e Colômbia (84 pontos). A exceção é a Argentina, que em meio à crise econômica e tensão eleitoral, tem taxa perto de 900 pontos.
Risco de calote
Com o atual nível do risco país, os investidores atribuem probabilidade implícita de calote do Brasil de 2,1% nos próximos cinco anos. Na Argentina, essa chance é de 15%. Um ex-diretor do Banco Central ressalta que o mercado já estava considerando o Brasil com nota um nível acima na classificação das agências de risco quando o CDS estava na casa dos 180 pontos. Esse movimento se acentuou agora e o país é precificado em “BBB”, ou seja, três níveis acima da nota atual.
Na avaliação do economista para América Latina em Nova York da consultoria norte-americana Continuum Economics, Pedro Tuesta, a principal razão por trás da queda do risco país é o avanço da Previdência e a expectativa de que a aprovação vai reduzir os juros, melhrando a nota da dívida do Brasil. Mas a retomada da classificação grau de investimento pode demorar mais tempo. Ele espera o retorno para o seleto grupo de bons pagadores em pelo menos daqui a dois anos.
Pesquisa do Bank of America Merrill Lynch feita este mês com investidores internacionais mostra otimismo com o Brasil: 85% acreditam que o País vai reconquistar o selo de grau de investimento, com metade esperando que isso ocorra até 2021, 20% até 2022 e o restante “até 2023 ou além”. Apenas 5% não veem o Brasil voltando a ter essa classificação.
Fonte: Altamiro Silva Junior, Renée Pereira e Luciana Dyniewicz, O Estado de S.Paulo